quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Desafio de contos - Tema: "Música e História"; conto: 'O Castelo Tão Bonito Que Desmoronou" autor: Will





A música tocava em volume alto. Tomei mais um, de tantas dezenas, gole de cerveja. As ideias se misturavam. “Eu não sou cachorro não, pra viver tão humilhado” diziam os versos, e eu repetia para mim mesmo: “não, não sou”. Eu lembrava do Antonio me dizendo: “Almir, abre o olho”, mas eu só acreditei quando vi com meus próprios olhos.
Ela estava linda, bem vestida, bebendo, fumando e rindo; parecia tão feliz e despreocupada dentro do carro. Ao volante um homem desconhecido, que a olhava com desejo. “A pior coisa do mundo é amar sendo enganado”; esses versos me rasgavam por dentro. Os olhos marejavam. Olhei para o céu e pedi a Deus que dissesse que aquilo não era verdade. Mas era. Na semana seguinte, à noite, tudo escuro, passei ao lado do carro, lá dentro os dois nem me notaram, estavam se agarrando. Quase perdi a cabeça na hora, mas me contive. Eu já tinha pensado em algo. Tinha um plano.
Quem despreza um grande amor não merece ser feliz, nem tampouco ser amado”, depois de ouvir esses versos, e já decidido, eu levantei, e quase me desequilibrei. Estava bêbado. Mas não evitaria que eu fizesse o que tinha em mente. Cheguei no estacionamento da boate onde sabia que eles estavam. Não demorei para achar o carro do homem. Aquele carro onde eles se esfregavam desavergonhadamente.
Menos de cinco minutos depois e eu já estava num ponto afastado, de onde poderia ter uma visão privilegiada. Tirei do bolso da jaqueta uma garrafa de uísque e fiquei bebendo aos poucos, esperando.
A saída do estacionamento dava para uma ladeira íngreme. Duas horas depois da minha chegada, e os vi saindo da boate, agarrados, trocando carícias. Eles entraram no carro, saíram do estacionamento e começaram a descer a estreita avenida. O carro foi cada vez acelerando mais. Eu, bêbado, ria às gargalhadas ao imaginar o homem pisando no freio e ele não funcionando, e os gritos aterrorizantes dela diante da morte iminente.
Fui embora depois de ver aquele fusca preto transformado em aço retorcido e incendiado, com dois corpos carbonizados dentro dele e repetindo para mim mesmo: “Eu não sou cachorro, não!”.

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